Nota do Ricardo: Convidei a Ingrid para escrever esse texto, depois de uma meia hora conversando no chat do Facebook sobre histórias de natal muito divertida. Leiam 🙂
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A primeira vez que vi um porco foi na ceia de Natal. Aos 7 anos, aquele leitão a pururuca parecia maior do que realmente era. Cabia numa travessa mediana, sem muito luxo. Pele crocante e escura. E como brilhava por causa da capa de gordura. Tinha um aroma difícil de descrever. Para uma criança em fase de alfabetização, o cheiro talvez fosse de caramelo temperado com cravo e laranja.
Mas não era o cheiro, não era a cor, não era o tamanho que impressionavam. Eu simplesmente não podia tirar os olhos daquele bicho na travessa. O leitão tinha cara de leitão, orelha de leitão, rabo de leitão… E na boca, vejam só, uma singela e mirrada maçã. Pobre maçã. Toque final de vó caprichosa, daquelas que passam a véspera de Natal bem perfumadas, só para constrastar com o cheiro de torresmo impregnado pela casa.
A minha mãe, nascida e criada em fazenda, logo rejeitou. A lembrança do porco de estimação, criado dentro de casa com mimos de cachorro, era mais forte do que o aspecto suculento da carne. Menino, esse era o nome do suíno cor-de-rosa, que viveu bons anos de regalias ao lado da filha do fazendeiro, no casarão. Quando Menino passou dos cem quilos, emperrou na porta. Virou linguiça. A lembrança da morte ainda causa arrepios e revolta na dona dele, que passou duas décadas sem provar carne de porco.
A ceia de Natal de 1.985 tinha tudo para ser um desastre. Era arroz com uva passa e o leitão tinha cara de leitão. Jeitão de leitão. E gosto de leitão. Delicioso. Menino, nunca mais provei igual.
Foto: Amy Glaze